segunda-feira, 2 de novembro de 2020

Intervenção da eleita Bárbara Barros na Assembleia Municipal de Braga sobre a Estratégia Cultural Braga 2030

Sobre esta proposta, a primeira de uma estratégia cultural para Braga, começamos por saudar o seu alcance e abrangência. Uma estratégia que diagnostica as principais fragilidades da produção e fruição cultural no concelho, ao mesmo tempo que tira partido da riqueza e diversidade desta região.

Parece-nos especialmente importante a atenção dada ao acesso equilibrado à cultura por todo o território, valorizando as tradições mais populares das artes do concelho e pretendendo trazê-las para o circuito cultural urbano, sem, por isso, querer apropriar-se delas, mas antes respeitando o seu espaço e implementação.

Tal como o diagnóstico desenvolvido para a construção desta estratégia também reconhece, Braga é concelho de cultura, diversa e com vários públicos; de criação e tradição; memória e património. No entanto, o reconhecimento da cultura como "um dos pilares do desenvolvimento sustentável de uma cidade" nem sempre foi imediato. Aliás, o equilíbrio que se pretende alcançar nesta espaço de 10 anos, "entre cultura, economia, inclusão social, ambiente" e outros factores de desenvolvimento é, a nosso ver, a principal novidade que esta estratégia vem trazer para a política municipal de Braga.

Estamos habituados a ver orçamentos atrás de orçamentos com reduzidas verbas para a cultura; uma aposta muito residual na sua promoção e mesmo na sua salvaguarda. Esta estratégia - que, pelo contrário, entende o valor cultural como um todo que envolve não só diferentes áreas de criação e saber, como diversas entidades que por ele são responsáveis - vem contrariar em toda a linha, e bem, o afunilamento da actividade cultural centrada nos dois principais equipamentos da cidade, o Theatro Circo e o Gnration.

Esta proposta vai ainda mais longe, ao recolocar no centro dos objectivos a participação cultural democrática dos bracarenses, como forma e oportunidade também de participarem nos processos de reconfiguração da cidade. Aliás, o quarto eixo desta estratégia, dedicado à cultura, território e paisagem, identifica como objectivo não só essa participação como a salvaguarda da "paisagem, monumentos, ruas e praças, tradições e crenças", que constroem a "identidade individual e colectiva" do concelho.

Muito diferente da abordagem que esta mesma maioria tem com a requalificação do edifício da Fábrica Confiança, parte insubstituível dessa memória colectiva que, hoje, nesta estratégia que aqui votamos, se pretende salvar, valorizar e potenciar, através ainda, por exemplo, de "leituras contemporâneas do património" ou da "participação na reconfiguração física da cidade" e de "soluções criativas para o espaço público que garantam resposta a usos e problemáticas colectivas".

Ora, não nos parece que a leitura destes objectivos se coadune com a alienação de património cultural bracarense para uma leitura tão literal de "contemporaneidade" - vulgo, o negócio do arrendamento. Nem a forma como esta maioria tem decidido do futuro da Fábrica Confiança, de costas voltadas com a opinião popular e mesmo com hostilidade face às suas manifestações, se alinha com o espírito que encontramos nesta documento.

Um equipamento cultural como a Fábrica Confiança, sublinhamos, capaz de juntar o passado ao futuro, o património à formação, criação e fruição de formas culturais tão diversas quanto a diversidade cultural de Braga, seria uma mais-valia incontestável para o desenvolvimento desta estratégia.

Preocupa-nos, pois, que esta boa estratégia não encontre uma capacidade de lhe responder à altura, já que ela dependerá de novas formas de trabalhar, como bem se identifica nesta proposta, mas também de uma política cultural que a acompanhe e que a consolide. Política cultural esta que depende, por sua vez, da vontade de uma maioria que terá que entender que ela depende também de outras estratégias municipais.

Como também este documento correctamente enumera na análise SWOT desenvolvida na fase de diagnóstico desta Estratégia Cultural, identificam-se obstáculos em Braga como o "excesso de circulação e tráfego automóvel no centro da idade", "excesso de ruído, visual, físico e sonoro, no espaço público" ou a "escassa oferta de parques e espaços verdes". Obstáculo que só uma aposta séria num projecto municipal que transforme os interesses dos munícipes em prioridade conseguirá ultrapassar.

Por outro lado, questionamo-nos que compromisso fará esta maioria, inclusivamente já no orçamento a apresentar no próximo mês, com esta estratégia, já que a sua implementação dependerá de uma aposta financeira séria. Num município cujas verbas alocadas à cultura têm sido mais do que tímidas, tememos que as inúmeras iniciativas que darão corpo à implementação da Estratégia Cultural fiquem reféns da capacidade política em reforçar prioridades com investimento municipal.

Têm sido muitos os exemplos da falta de investimento próprio em várias necessidades do concelho, tanto que os grandes projectos que arrancaram durante estes anos foram todos fruto de linhas de apoio de fundos comunitários para cumprir objectivos que a União Europeia definiu como prioritários. Mais vezes do que menos, o município de Braga tem ido atrás destes prioridades ao invés de definir as suas próprias, o que resulta em soluções avulsas.

Esta estratégia, e muito especialmente porque ela se estende desde este ano agé 2030 - mas também porque dela depende a candidatura a Braga Capital da Cultura em 2027 - não pode ficar à mercê de investimentos e soluções avulsas, até porque as iniciativas nela previstas não se bastam a si mesmas: compreendem-se em conjunto, em complementaridade, precisamente por construírem, juntas, uma estratégia única, que de todas depende.

Esta é, portanto, uma boa estratégia - que hoje aqui aprovaremos -, deveras inédita neste concelho, mas cujo sucesso dependerá grande e exclusivamente, mais do que os naturalmente necessários mecanismos de avaliação e acompanhamento da sua implementação ao longo dos próximos 10 anos, de fortes investimentos, devidamente inscritos nos planos e orçamentos municipais, e da seriedade com que se encare uma política cultural à altura deste desafio. Não estamos é convencidos que seja esta maioria a capaz de levar a cabo tão nobre missão.

O Grupo Municipal da CDU
Braga, 30 de Outubro de 2020